A MEMÓRIA DOS MÁRTIRES ESTÁ NO CORAÇÃO DOS POBRES

Santo súbito:
São Romero, São Sepé, Santa Maria Alves, Santo Dias.
Apelo ecumênico para o dia 1º de maio de 2011.



Um grupo ecumênico popular escolheu o dia 1º de maio de 2011 para declarar a canonização de São Romero da América pelos pobres. O grupo queria, certamente, colocar João Paulo II em boa companhia. No mesmo dia, o papa Wojtyla será beatificado pelas instâncias romanas. Quem diria: Dom Oscar Arnulfo Romero e João Paulo II, abraçados, como amigos, entrando no panteão dos santos! Sabe-se lá porque em vida esse abraço foi negado a Oscar Romero.
Quando, no meio dos avisos paroquiais, esse fato é comentado pelo pároco da Igreja dedicada a Santo Expedito, uma voz mansa, nos fundos do templo, pergunta: “Não teríamos, ao lado do Santo Padre, também um padre santo ou uma madre santa para beatificar ou para canonizar, de vez?”

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Galdino Pataxó

“Sim senhor”, responde um romeiro nordestino, sexagenário com voz rouca: “Temos padres e freiras santos: O padre Cícero, o padre Ibiapina (cf. http://www.eduardohoornaert.blogspot.com/), o frei Damião, a irmã Dulce, a irmã Dorothy!”

Minha vizinha, no banco da frente, mulher esclarecida do povo sofrido, mexe-se inquieta e faz uma pergunta simples e direta: “Só têm padres e freiras no céu? E nós, o povo, onde ficamos? Por acaso, ninguém de nós entra na ladainha dos santos?”

“Na ladainha, talvez, não, mas no céu, sim!”, responde um jovem afoito da PJ, descendente dos guarani da região de Itanhaém, litoral sul de São Paulo. E ele começa a falar de São Sepé (1756), de Ajuricaba, de Zumbi (1695), dos mártires do Quilombo dos Palmares, de Marçal Guarani (1983), de Margarida Maria Alves (1983), da líder Rose, na ocupação da Fazenda Anoni (1985), do Pataxó Galdino Jesus dos Santos (1997) e de Santo Dias (1979).
Rose, líder na ocupação da fazenda Anoni, 1985
E nosso jovem da PJ acrescenta: “Ao menos este último deveria ser santo súbito”. Depois justifica: “Nasceu como filho de Jesus, filho de Jesus Dias da Silva e Laura Amâncio Vieira. Foi batizado como `Santo´ e morreu como mártir, dia 30 de outubro de 1979, assassinado pela PM na porta da fábrica Sylvânia, de São Paulo, dando apoio aos seus colegas em greve. Seu corpo foi velado na Igreja da Consolação. No dia 31 de outubro, 30 mil pessoas saíram às ruas da Capital para acompanhar o enterro e protestar contra a morte do líder operário, pelo livre direito de associação sindical e contra a ditadura.

O presidente do Conselho Paroquial fecha a reunião com uma invocação de santos populares, ligados ao 1º de Maio, dia do trabalho, da trabalhadora e do trabalhador: "Santo Dias, (todos) rogai por nós. Santa Margarida Maria Alves, rogai por nós. São Romero das Américas, rogai por nós!”

DA RESSURREIÇÃO À INSURREIÇÃO: ESTAMOS CHEGANDO!


Encontro Nacional dos Povos Indígenas
em defesa da Terra e da Vida

Entre os dias 29 de abril e 1º de maio, o Centro de Formação Vicente Cañas, em Luziânia (GO), recebe o Encontro Nacional dos Povos Indígenas em Defesa da Terra e da Vida. O evento tem como lema “Vida e Liberdade para os povos indígenas – Povos Indígenas construindo o Bem Viver.” Sob a organização do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), o encontro contará com a presença de cerca de 180 lideranças indígenas, de missionários e de aliados da entidade.
As discussões terão como eixo a luta pela reconquista dos territórios e contra o processo de criminalização de lideranças, assim como o enfrentamento aos empreendimentos que impactam terras e territórios indígenas.

LA RECUPERADA

Recuperar ou transformar? 
Vigilantes da Justiça da Ressurreição

Assisti, na Faculdade de Saúde Pública da USP, à “Plenária de Encerramento” do VII Colóquio de Psicopatologia e Saúde Pública integrado, num I Colóquio Internacional sobre “Invenções Democráticas em Interação” (8.-10.4.2011). O evento reuniu reflexões sobre movimentos cujas bandeiras são educação democrática, economia solidária, justiça restaurativa e psicopatologia para a saúde pública.
Ana Maria Fernández, professora de Teoria e Técnica de Grupos, relatou experiências entre os kolla, povo indígena que se encontra na Argentina, no Chile e na Bolívia. Sua economia, na base da troca de bens (escambo) e por não passar pelas exigências de compra e venda do mercado, tem todas as condições para ser solidária. Em seguida, Fernández descreveu, com poucas pinceladas, a alegria dos operários que conseguiram, em regime de autogestão, recuperar fábricas falidas. Na Argentina funcionam cerca de 300 dessas “recuperadas” da mão do patrão, mas não das garras do capital. Recuperaram o controle de gestão e produção, mas logo sentiram as pressões sistêmicas do mercado mundial e perceberam, que a “recuperada” os inseriu, novamente, no sistema concorrencial de produtividade e exploração laboral.

Usina Catende: Greve na Recuperada

Algo semelhante ocorreu com a Usina Catende, localizada na região da Mata Sul Pernambucana. A usina faliu, há 18 anos, e foi assumida pelos próprios cortadores de cana. No início de 2011, a notícia de trabalho escravo, na Usina Catende, percorreu o país. Voltaram as figuras centenárias do senhor de engenho, agora representado por lideranças jovens de ex-cortadores de cana, e do trabalhador em condições semelhantes à escravidão. O conluio da corrupção dos novos líderes, da falta de produtividade, do atraso no pagamento de salários e das condições precárias de trabalho desencadeou, no início de fevereiro, greves e paralisações. As “recuperadas” e as mais de 20 mil empresas de autogestão no Brasil não transformaram os operários em produtores livres, mas em administradores de sua própria alienação. 

Tarsila do Amaral: Operários

Perguntei-me, durante o Colóquio, sobre o porquê da ausência da voz da Igreja nesse diálogo. Ela poderia aprender nesses debates inquietos como assentar a sua mensagem em contextos sociais e traduzi-la em linguagens inteligíveis. Com seu aguilhão antissistêmico do Reino, poderia apontar para um horizonte além do capital, insistir na superação do trabalho alienado, pisar no freio de emergência de um desenvolvimento de produtos descartáveis e, destarte, libertar a sua própria reflexão ainda presa num emaranhado de conveniências institucionais e autoritarismo patriarcal.

Recuperação - um processo aberto
A Igreja pós-conciliar, em seu conjunto, passou por processos semelhantes às fábricas recuperadas pelos operários. Sinais desta recuperação pelos operários eclesiais, os fiéis e o povo de Deus, em seu conjunto, não faltam. Criaram-se, nos primeiros momentos pós-conciliares, Sínodos Universais, Assembleias Regionais do Povo de Deus, Conselhos Paroquiais com mandato para tomar decisões. Havia consultas prévias, respeitadas, para as nomeações dos bispos, estilos eclesiais menos pomposos, opção pelos pobres, teologias e pastorais inseridas nos contextos. Era o espírito do “Pacto das Catacumbas” (ver o texto na coluna ao lado), que se realizou apenas em pequenos enclaves eclesiais.
Durante o papado de João Paulo II, que impressionou como ator político e figura humana, a maior parte dessas iniciativas foi reduzida a formalismos burocráticos ou dinâmicas de grupo, sem espaços reais para as bases leigas da Igreja ou para o exercício da diversidade. No chamado “Sínodo das Américas” (1997) assisti de perto a tais dinâmicas. Temas proibidos impossibilitaram o diálogo. Vivemos, desde a era Wojtyla, uma espécie de peronismo light. O estilo de um líder, cujo carisma é bem cuidado nas aparições públicas, torna-se modelo. Sua áurea de santidade assegura autorelevância institucional e blindagem doutrinal de questões secundárias, muito além da infalibilidade dogmática definida. Mas, a santidade pessoal não garante a ortodoxia pública nem o bom senso nas decisões administrativas. Temos, como exemplo, o antimodernismo de Pio X, que causou muito sofrimento desnecessário. Hoje, praticamente, é uma vergonha para um papa, não ser canonizado.

Na Igreja Católica aconteceu algo comparável ao ocorrido na Usina Catende, recuperada pelos operários e logo, novamente, recuperada pelo espírito patronal. No Vaticano II, a Igreja deu sinais de recuperação da modernidade e de participação do povo de Deus e dos pobres. Já na época pós-Medellín, o engenho eclesial foi novamente recuperado pelos antigos donos, pela volta à pré-modernidade e seus modelos caducados de santidade e autoridade. Mas, o discurso do Reino é insustentável num regime que despreza a liberdade de expressão e a participação gerencial, num regime que foge, em nome da universalidade de sua proposta, da contextualização de sua mensagem e do reconhecimento incondicional do Outro.
Ocorre que a história do mundo não é linear. A recuperação da Igreja pelos seus operários, que são as samaritanas e os pobres, acontece num constante vaivém. Embaixo dos tapetes oficiais há energia inovadora represada que, sempre de novo, será administrada pelos pobres e os outros, que são os bem-aventurados de Jesus. Eles vêm da grande aflição e lavaram as suas vestes no sangue do Cordeiro. Eles são os vigilantes do Reino, os zeladores não apenas da recuperação, mas da transformação. Transformação significa: Justiça da Ressurreição. Seu sofrimento e sua solidariedade interrompem, por instantes, os discursos autorizados e descortinam a neblina da alienação. Enquanto a palavra de ordem na Usina Catende pós-greve, “A Usina para os Operários e as Terras para os Camponeses Pobres”, abre uma nova dicotomia estrutural, a palavra de ordem da Igreja, recuperada pelos pequenos, será a ordem de Jesus histórico e do Cristo Ressuscitado: Não tenhais medo! O Reino será dos perseguidos por causa da justiça e os mansos possuirão a terra.
Paulo Suess
 

O RETORNO DO ENVIADO DO PAI

José Comblin: Missionário migrante, teólogo militante

Um dos livros mais belos de José Comblin é “O Enviado do Pai”, sobre a centralidade da missão no Evangelho de S. João. Comblin fez de sua vida e de sua teologia um desdobramento dessa centralidade da missão. O livrinho é um vade-mécum missionário que nos mostra em Jesus “um novo modo de ser humano, ou, melhor dito, o modo de ser autenticamente humano”.

José Comblin em Medellín - 2008
José Comblin era um dos homens e teólogos mais autênticos que conheci, quando estudei em Lovaina, mais tarde como colega em São Paulo, como missionário entre grupos populares e como teólogo em Medellín, quarenta anos depois do evento singular da Segunda Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano (2008). Lá ele dizia: “Os bispos de Medellín foram os fundadores da Igreja latino-americana como Igreja particular, que deixou de ser uma cópia das Igrejas europeias”. Segundo Comblin, Medellín constituiu um fato extraordinário porque seu foco era a missão da Igreja como serviço ao e no mundo. Medellín assumiu o famoso “Pacto das Catacumbas” de alguns bispos durante o Vaticano II, que representava o compromisso de fundar uma Igreja dos pobres. O horizonte das discussões de 1968 não era a instituição eclesiástica, mas o Evangelho. Medellín era o berço da Teologia e Pastoral da Libertação.

Hoje não sinto nenhum constrangimento de chamar José Comblin o “enviado do Pai”, que veio incomodar-nos. Ele sabia, quando, em 1958, foi enviado da Bélgica para a América Latina que não vinha para uma missão diplomática de um Núncio. Seu mandato era o anúncio precedido por uma nova prática pastoral. Comblin incorporou no padre-mestre, que era, o beato e peregrino nordestino.


Padre Ibiapina (1806-1883)
Caminhada e movimento, palavras-chave de sua biografia, o levaram para Campinas, São Paulo, Santiago do Chile, Recife, Camaragibe (PE), Quito, Riobamba, Lovaina, Talca, Serra Redonda (PB), Bayeux (1995), na periferia de João Pessoa (PB), e, finalmente, para Barra (BA). Todo ano marcava presença em nosso curso de pós-graduação em Missiologia, de São Paulo. Provocava os estudantes (padres!) com sua ênfase ao laicato, com seu espírito libertário paulino, com sua radicalidade missionária de andarilho e sua autenticidade vivencial. Com o sorriso manso de posseiro militante, desnudou ideologias travestidas de verdades eternas.

Sempre aluno e professor, guiado pelo Espírito e a Palavra de Deus, trouxe de cada uma de suas estações biográficas experiências de Deus, enraizadas na vida do povo. Soube transformá-las em experiência teológico-pastoral marcante – a mais notória delas, a “Teologia da Enxada”. A metodologia era sempre a mesma: Forjar a teologia a partir da vida concreta dos pobres, de seu trabalho e de sua mística, de sua alegria e de seu clamor. Sim padre Zé, aprendemos de você, que teologia descontextualizada é ideologia que defende interesses institucionais!

De cavernas remotas deste Continente, nosso peregrino das Américas trouxe notícias de vida ameaçada, de sobreviventes e de mártires. Lutou quando era fácil ceder, denunciou, quando era esperado consentir. Seus discernimentos pastorais eram certeiros, seus prognósticos conjunturais, às vezes, pessimistas. O curso da história, cheio de surpresas dialéticas e voltas inesperadas, o desmentiu em várias ocasiões. José não era adivinho. Era professor e confessor, profeta e testemunha fiel. Quantas lutas teve de assumir por um poço de paz!

Transfiguração
 Dia 27 de março, no 3º Domingo da Quaresma, pelas 8:30 horas da manhã, José Comblin partiu para a sua Grande Viagem, como costumava dizer, e retornou à casa do Pai. Faleceu no pequeno sítio “Recanto da Transfiguração”, município de Simões Filho (BA), na periferia da metrópole de Salvador (BA). O “Recanto” é administrado por uma comunidade de leigas consagradas à Santíssima Trindade, muito amigas de José. A caminho de Salvador (BA), para fazer um exame médico de rotina, ficara no “Recanto”, que era a sua “Bethânia”. Chegou na quinta-feira, dia 24. Como historiador, certamente, se lembrara nesse dia de outro 24 de março, em 1972, quando foi expulso do Brasil. Chegou no "Recanto" dois dias após celebrar seu 88º aniversário, na Barra (BA), sertão da Bahia. Na Barra, o profeta franciscano dom Luiz Cappio, o teólogo José Comblin e a samaritana leiga, Monica Maria Muggler, constituiram uma comunidade teológico-pastoral trinitária. Nos últimos anos, quando alguém perguntava: “Oh padre Zé, como vai o senhor?”, ele respondia: “À sombra de um santo como dom Cappio, eu só posso estar muito bem!”.
 
Santuário de Santa Fé do padre Ibiapina
Hospedado num apartamento, na sacristia da capela do “Recanto da Transfiguração”, no dia de sua “Grande Viagem”, o peregrino fez a barba, como sempre, tomou seu remédio, colocou o relógio e abriu as duas portas de passagem para a capela e o jardim. Logo retornou. Monica, que o viu do outro lado do jardim, logo veio com um guarda-chuva, pois garoava. Chamou: “José!” – silêncio. Adentrou até o quarto e lá estava José sentado na cama, inerte. Mais tarde, o cardiologista constatou uma embolia cerebral. Morte instantânea. Na hora do crepúsculo, dom Cáppio convidou a celebrar a Eucaristia de corpo presente. Com um sorriso velado nos lábios, José irradiava paz. Terça-feira, dia 28, foi sepultado no município de Solânea (PB), no Santuário de Santa Fé do padre-mestre Ibiapina, como era seu desejo.

Um dos seus últimos livros sobre “A profecia na Igreja”, José Comblin terminou assim: “Eu estou no final da vida. Tive o privilégio de conhecer de perto e de participar da vida de grandes profetas e também de muitos pequenos profetas, homens e mulheres, que não entraram oficialmente na história. Desejo que muitos jovens possam fazer a mesma experiência”.

A travessia
Deus foi bom com seu servo justo e fiel. O acolheu para a Páscoa definitiva, num Domingo, dia da ressurreição. Chamou o peregrino cansado, sentado, desde um “Recanto da Transfiguração” e um município, Simões Filho (BA), em cujo brasão está inscrito: Angelus Pacis, Anjo da Paz. Na sua grande travessia, o enviado do Pai, o padre-mestre José, peregrino e guerreiro, não estava sozinho. Foi acompanhado pelo Anjo da Paz.
Paulo Suess, do Porantim

Dom Aldo Mongiano, de Turim, escreveu:

Caro P. P.Suess
Lì com muito interesse teu artigo sobre P. Comblin. Não sabia nada da vida dele. Mas li alguns livros que me arrebataram pela visão profética. Afinal, desde muitos anos deu prova de saber ler a escritura e a vida do povo na América Latina para apontar o camiho da evangelizaçào que eleva os pobres. Foi uma alma profética, soube diagnosticar os males, refletir sobre a palavra de Deus e apontar caminhos. Marcou a Igreja do Sul do mundo. Foi um dom de Deus e uma liçào para nós.

SOLIDARIEDADE SEM FRONTEIRAS

“Voces não estão sós! A justiça vai prevalecer!”.

Crianças, adolescentes e jovens canadenses enviaram cartas e cartões de solidariedade para seus irmãos do Ypo’i, comunidade Kaiowá Guarani, distante a milhares de quilômetros daí. A iniciativa foi da Anistia Internacional no Canadá.
Final de março. Três mulheres, da equipe do Cimi Dourados, seguem in direção do território Ypo’í. Têm uma missão especial. Levam consigo mais de mil cartas e cartões de solidariedade à comunidade do Ypo’i. Elas têm que ir à noite, atravessando fazendas. O fazendeiro Escobar não deixa ninguém chegar lá pela estrada. Porteira e cadeado fechado impedem o acesso à comunidade indígena. O cerco só está rompido parcialmente por uma decisão judicial que autoriza a Funai e a Funasa prestarem assistência à comunidade, duas vezes por mês.
Muita alegria com a chegada das carteiras. O dia amanhece com ritual de gratidão. A aldeia de umas dezenas de casas cobertas de sapé ou lona preta é um aguerrido grupo que resiste em seu tekoha, seu território tradicional. Se a presença de pessoas solidárias já é motivo de muita alegria, imaginemos a cena da entrega das cartas. A sensação de que o mundo envolvesse o pequeno espaço de mata onde a comunidade está cercada. Parecem voar livres nas asas da solidariedade expressa em centenas de desenhos e escritos. Depois de momentos de sentir e apreciar o inacreditável, os cartões se transformam num imenso varal de solidariedade. Solidariedade vem, alegria vai. A resposta vem em gestos de gratidão e felicidade expressos em mais de uma centena de desenhos e escritos que tomem o destino inverso: de Ypo’i ao Canadá.
“Esse é o dia mais feliz de minha vida”, declarou Rodolfo emocionado. Relembrou os momentos difíceis em que foram atacados, torturados e assassinados os dois professores, Genivaldo e Rolindo no final de outubro de 2009. Até hoje não foi localizado o corpo de Rolindo e o inquérito está com o Ministério Público Federal de Ponta Porã.
As três mulheres, carteiras e mensageiras, retornaram a Dourados como as Três Marias de um céu estrelado de solidariedade. Levaram dezenas de cartões de gratidão que serão enviados aos amigos do povo Guarani, no Canadá. Solidariedade sem fronteiras!

Dourados, inicio de abril de 2011, Egon Heck

PERSPECTIVAS DA TEOLOGIA ÍNDIA

Resumo da Mensagem do Simpósio de Lima

+ Felipe Arizmendi Esquivel
Obispo de San Cristóbal de Las Casas

Ver

D. Felipe Arizmendi
Desconocida por unos, malentendida y atacada por otros, la llamada Teología India se esfuerza por demostrar su validez y ofrecer su aporte a la teología, a la inculturación de la fe y a la encarnación de la Iglesia. No ha elaborado tesis doctrinales como las que conocemos, pues su método no procede a base de raciocinios especulativos, sino según el modo cultural de los indígenas, que es más simbólico, mítico, figurativo, concreto y contemplativo. Su interés fundamental es coadyuvar a una vida más digna y plena de los pueblos originarios. En Aparecida se discutió incluir su nombre en el documento final, pero por falta de suficientes votos no prosperó la propuesta. Se le llama también teología inculturada, reflexión crítica de la fe de los pueblos indígenas.
Eleazar Lopes
En días pasados, nos reunimos en Lima, Perú, 43 personas, obispos, sacerdotes, religiosas y laicos, varios de ellos indígenas, para el IV Simposio Latinoamericano de Teología India. Fuimos convocados por el CELAM y estuvo presente la Congregación para la Doctrina de la Fe. El tema fue la teología de la creación en la fe cristiana y en los mitos indígenas, según las variadas cosmogonías de nuestras culturas aborígenes. Los mitos no son cuentos, leyendas o fábulas, sino un una forma de expresar realidades trascendentes, a base de símbolos y lenguaje figurado, como lo hacen algunos textos de la Biblia, del Génesis al Apocalipsis.


Juzgar


Roberto Tomichá e Enrique Jordá
Entre muchos otros frutos de este diálogo eclesial, consideramos necesario continuar el proceso de discernimiento de la Teología India, que no es teología de la liberación, a la luz de la Palabra de Dios, la Patrística y el Magisterio eclesiástico. Dejar de resaltar sólo heridas pasadas y sistematizar los aportes ya consensuados, para socializarlos al servicio de las iglesias particulares.


Rebeca Spires e Nello Rufaldi
 Para que sea teología católica, su fuente y criterio de verdad ha de ser siempre la revelación divina, que en Jesús llega a su plenitud y cumplimiento. Estamos vinculados a la historia concreta de Jesús y El es normativo para la Iglesia. Es el Logos en su totalidad, el único Salvador, y se puede discernir su presencia en todos los pueblos y culturas. Cristo y el Espíritu estuvieron presentes en América antes de la evangelización; pero esta presencia del Verbo puede estar mezclada con elementos humanos de imperfección y, por qué no decirlo, de pecado. El Concilio Vaticano II nos pide elevar, purificar, llevar a cumplimiento lo que Dios ha hecho en los pueblos. Es clara la fijación del canon del AT y NT y no hay más libros revelados. Cuidar el lenguaje para no poner en el mismo nivel la Palabra de Dios revelada y los mitos nativos.

Mons. Victor Corral, Riobamba
Con el fundamento irrenunciable de nuestra fe católica en un solo Dios creador, en Cristo único Redentor y en la Iglesia como sacramento de salvación, acercarnos con la mente y el corazón a los pueblos originarios, para conocer, valorar y discernir la presencia de Dios en sus mitos y ritos, y ofrecerles –sin imponerles- la plenitud de Cristo, único camino de vida plena. Debemos aprender de la sabiduría de los indígenas; su aportación es un bien para todos; pero debe quedar claro que nada añaden a Cristo y a su plenitud, aunque sí pueden ayudar a nuestra percepción de su plena verdad.

Escuchar a los indígenas y a los agentes de pastoral que desgastan su vida con ellos, para que expliquen a los no indígenas el por qué y el cómo de sus mitos y ritos, y así tener información confiable antes de emitir un juicio sobre su ortodoxia o heterodoxia. Un mito no puede ser propuesto a priori como semillas del Verbo, sino después de un discernimiento oportuno.

Actuar

Fotos: Poncio Acosta, Endepa

 Continuar estos diálogos, para clarificar temas centrales de nuestra fe y las culturas aborígenes, como Trinidad, Soteriología, Espíritu Santo, Eclesiología, Sacramentos, etc., con apoyo del CELAM y la Congregación para la Doctrina de la Fe.
Los candidatos al ministerio presbiteral y aspirantes a la vida consagrada que van a servir en esos pueblos, tengan oportunidad de acercarse a ellos, conocer su idioma y valorar sus tradiciones, para que la pastoral evangelizadora sea más inculturada.


Oficina diocesana de Comunicación 01(967) 67 8 79 69 claucorroy@diocesisdesancristobal.com.mx


VIGIAR, PUNIR, SONHAR

IV Simpósio “Teologia Índia”
(28.3. a 2.4. 2011, Lima, Perú)


Ontem, dia 2 de abril, terminou o IV Simpósio “Teologia Índia”, organizado pelo Conselho Episcopal Latino-Americano – Celam, em Lima. Lima é a cidade que enterrou seu conquistador e fundador sanguinário, Francisco Pizarro, em sua catedral. Mas, Lima é também o lugar de santos extraordinários que se dedicaram aos pobre: Martín de Porres, Rosa de Lima, Francisco Solano, Juan Macías e Toribio de Mogrovejo. Lima, com seu Museu da Inquisição e suas Igrejas coloniais, simboliza até hoje, como a própria Teologia Índia, trigo e joio da nossa realidade pastoral.

Foto: Eden Magalhães

Tema e lema do Simpósio foram: “Teologia da criação na fé católica e nos mitos, ritos e símbolos dos povos indígenas cristãos na América Latina” - “O sonho de Deus na criação humana e no cosmo”. Na época de Medellín, o Celam, com sede em Bogotá, já teve seus dias de glória e seu papel profético na Igreja latino-americana. Hoje participa do profetismo-bonsai, institucionalmente acuado pelo centralismo romano com seus dois braços, os movimentos carismáticos e as nunciaturas apostólicas, cujo papel central é bem resumido pelo livro de Michel Foucault: “Vigiar e punir”. O que ultimamente aconteceu, através da chamada reestruturação da pastoral indígena, na Bolívia, e na patoral mapuche da diocese de Villarica (Chile), nos processos sucessórios dos bispos de Sucumbios e Riobamba, Equador, aponta para à inumanidade desse “vigiar e punir”, ampliado por um terceiro elemento, o “demitir” da noite para o dia, sem um obrigado minimamente civilizado.

Foto: Eden Magalhães
Aelapi

Os quatro simpósios do Celam, que se realizaram em Bogotá (1997), Riobamba (2002), Guatemala (2006) e, agora, em Lima, são continuações de Encontros anteriores, organizados pela Articulação Ecumênica Latino-Americana de Pastoral Indígena (Aelapi), que desde os anos 70 realizou Congressos, Cursos e Oficinas de Pastoral e Teologia Indígena. A Aelapi é um serviço eclesial ao diálogo inter-religioso que, a partir das aspirações dos povos indígenas, anima e articula a pastoral indígena na América Latina apontando para uma pastoral integral, específica, inculturada e libertadora. A Aelapi, que realizou, depois do IV Simpósio do Celam, seu encontro executivo, é uma instância que favorece a escuta fraterna e respeituosa da sabedoria dos povos indígenas, e, ao mesmo tempo, um espaço de solidariedade, compromisso e apoio às suas lutas e demandas. A Aelapi reune diversos organismos eclesiais de América Latina. A partir dos anos 90, realizou encontros específicos de Teologia Índia em México (1990), Panamá (1993), Cochabamba, Bolívia (1997) e Assunção, Paraguai, (2001). Em Lima foi definido também o próximo Encontro Continental de Teologia Índia, que vai ser realizado em Quito, Equador, com a parte infraestrutural organizado pelo Clai, de 10 a 14 de outubro de 2013. Como tema foi escolhido: "Palavra de Deus, palavra indígena". O lema, a Aelapi "emprestou" da Campanha da Fraternidade 2011, do Brasil: "A criação geme em dores de parto".

Teologia profética


Foto: Ponciano Acosta

A Teologia Índia é uma teologia profética e, por causa disso, é vigiada, punida e reprimida. Trata-se do conflito entre uma teologia descontextualizada com ajustes insignificantes no decorrer da história, e uma teologia contextual, que emerge, concretamente, dos projetos de vida e das lutas dos povos. A primeira se reproduz sem conhecimento da realidade; seus escritos representam textos fora de contextos. A segunda, a Teologia Índia, por exemplo, passa pela peneira da inculturação. Inculturação é “um imperativo do seguimento de Jesus” (Santo Domingo, 13). Jesus de Nazaré falou do Reino de Deus em parábolas contextualizadas, não em equações matemáticas universais.
Mons. Luis Francisco Ladaria
A partir de 2004, sobretudo no México, a Teologia Índia serviu de pretexto para perseguir um setor que voltou do Vaticano II (1962-1965) e de Medellín (1968) acreditando na descolonização como sinal de Deus no tempo; acreditou na Igreja autóctone e na inculturação, não como verniz, mas como raiz pastoral; acreditou na autodeterminação dos povos indígenas na sociedade e na Igreja. “Teologia Índia”, dizia o setor hegemônico, é a metamorfose da “Teologia da Libertação”, condenada e descontente com a sua derrota histórica.
Hoje, o setor da Teologia Índia conhece melhor seus limites. Defende silenciosamente avanços pós-conciliares, alegra-se com um afago da autoridade eclesiástica e, tendo vara curta, procura não cutucar a onça. As resistências continuam grandes. No Documento de Aparecida (2007), por exemplo, que defendeu a inculturação com frases de efeito (cf. 479, 491), o nome próprio de Teologia Índia foi explicitamente banido. Mas, o que aconteceu em Aparecida, repetiu-se também em Lima. Os adversários ideológicos tratam-se com cordialidade diplomática, cada um exaltando o próprio trigo e fazendo ponderações sobre o joio no campo do outro. A posteriori, quer dizer, no decorrer do tempo, esse joio deve ser erradicado.
O Simpósio foi convocado pelo Departamento de Cultura e Educação, Secção Povos Indígenas, e dirigido por Mons. Rodolfo Valenzuela, bispo de Vera Paz, Guatemala. De Roma esteve presente, nesse IV Simpósio do Celam, um sorridente Secretário da Congregação para a Doutrina da Fé, Mons. Luis Francisco Ladaria, que modestamente admitiu que nunca esteve perto de uma aldéia indígena. Mons. Ladaria apresentou uma palestra clássica “A doutrina cristã sobre a criação”. Pelo resto, manteve-se numa atitude agradável de escuta.

Mensagem


Na escada da catedral de Lima

Segundo a Mensagem Final, os participantes do Simpósio escutaram mitos de todas as regiões latino-americanas. Na diversidade dos relatos indígenas de criação se revela o Criador da vida a quem os povos chamam Mãe-Pai, que estabeleceu a harmonia primordial. Os mitos de criação permitem “aproximar-nos a Cristo presente nas culturas dos povos”. A Mensagem cita São Gregório Nazianceno: “o que não se assume, não se redime” (PG 37), que inspira alguns critérios teológico-pastorais:
- Cristo está presente en todas las culturas.
- Os agentes de pastoral devem conhecer o coração de sua cultura.
- Os autênticos protagonistas da inculturação são os povos indígenas.
- Deve-se valorizar as contribuições da Teologia Índia.
- Nas casas de formação e nos seminários deve-se fornecer informações sobre os mitos e as cosmovisções dos povos e oferecer teologias adequadas para sua compreensão.
- Urge descolonizar os modos de pensar, saber e sentir dos agentes de pastoral.
- É importante dialogar e articular processos eclesiais com movimentos indígenas.

Santa Rosa de Lima
- A diversidade é um dom de Deus e não uma invenção humana.
- Beleza e sabedoria de Deus se manifesta na diversidade cutural da vida dos povos e na biodiversidade.
Por fim, a Mensagem de Lima lembra a contribuição dos povos indígenas para a humanidade. Compreendem a humanidade como parte integrante da natureza e sabem que Deus, que está presente e próximo, zela pela vida da irmã-mãe Terra (cf. Aparecida, 125).
Em seu conjunto, o Simpósio deu uma importante contribuição sobre o lugar, onde estamos, e sobre o caminho, que está a nossa frente. Santa Rosa de Lima, rogai por nós e por nossos povos indígenas!